quinta-feira, 19 de março de 2009

Das coisas que NEM nos restam


Antes que começasse, terminou. 

Tanta coisa vai deixar de ser dita. Tantos sentimentos que nem existirão. Não haverá memórias a compartilhar. Não vai haver a lembrança dos momentos felizes. Não vai doer a angústia de uma viagem longa, sem comunicação.

Os ingressos do primeiro cinema juntos ainda estão na bilheteria. O garfo em que ele ofereceu a ela uma porção de sua sobremesa ainda está na gaveta. O canudinho da coca-cola parou na boca de uma pessoa qualquer que passou pela rua da lanchonete em que comeriam um dia. Os lençóis com o perfume e o suor dele ainda estão nas prateleiras da loja de departamentos.

Ela nem teve a chance de contar a ele histórias de sua infância. Ele não pôde contar a ela que seu cabelo bate nos ombros por culpa dos amigos que rasparam suas longas madeixas ao passar no vestibular, já há alguns anos. Ele não sabe que ela já sofreu um acidente de carro e quase morreu. Ela não sabe que ele pegou pneumonia e quase morreu.

Ela iria se apaixonar pelo sorriso dele. Ele iria se encantar com a placidez do rosto dela enquanto dorme. O prato preferido dela seria o risoto que ele faz com alcaparras. O passeio preferido dele seriam os fins-de-semana na casa de praia da família dela. Ela não passaria frio naquela noite, porque teria ganho dele um suéter de Natal. Ele não teria caído da escada do prédio porque ela sempre quis morar em casa.

O nome do primeiro filho seria escolhido por ela. O do segundo, por ele. Ele cuidaria das crianças durantes as férias para ela trabalhar. Ela passaria o Domingo todo cuidando da família. Ele apresentaria muitos livros interessantes a ela, enquanto ela enriqueceria os dias dele com músicas inesquecíveis.

Ela guardaria a rolha do vinho especial que tomaram no aniversário de casamento. Ele compraria um carro grande para caber toda a família. Ela aprenderia Inglês para acompanhá-lo no doutorado na Inglaterra. Ele deixaria de comer carne porque ela é vegetariana. Ela encheria a casa de porta-retratos porque ele adora tirar fotos. Ela conheceria neve porque ele adora esquiar.

Eles tinham tudo para ser felizes. Ou não. Não importa! Eles teriam um futuro pela frente.

Mas eles não sabem disso. Nem vão saber. Acabaram de se esbarrar ao atravessar a rua. E sequer olharam um pro outro.

2 comentários:

F@! disse...

... Ah!Tudo aquilo que poderia ter sido e não foi. Uma beleza de exercício gratuito - é brincar de casinha depois de grande!

Oi flor. Amo você :)

Anônimo disse...

Eu li isso em algum lugar, há algum tempo, mas não lembro o autor nem a frase corretinha:
"A pior coisa dessa vida é que, de 100 possibilidades, devemos escolher uma e viver a angústia das outras 99"
Beijos Thaís!
Você escreve bem demais!!