quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

1 acordo de damas e cavalheiros em 3 passos


Olhe nos meus olhos e diga que não quer mais olhá-los

Encoste seus lábio nos meus e diga que não quer mais beijar-me

Coloque sua mão sobre a minha e diga que acabou o passeio

Diga três vezes intensamente que acabou. Se você dormir em paz, eu entendo a minha guerra interior.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Hiperbólica notívaga divaga


Acordei no meio da noite. Tinha que escrever. Algo pulsava em mim e eu queria deixar sair. As mãos sobre o teclado revelam o desespero em apagar o branco da tela com as letras que a preenchem. O lápis e o papel, companheiros de todas as horas e palavras suplicam sua participação. Suplicam em vão. No meio da madrugada não cabem intermediários. Cabe apenas eu e a tela. Eu dizendo e ela ouvindo. E, neste momento, pouco importa o caminho das frases. Importa, sim, extravasar a conquista de mais uma conquista. Dividir com quem quer que seja essa sensação de me apoderar de mim mesma e governar tudo isso que sou eu.

O navio ganha um capitão e minha percepção ganha novos contornos. Vamos navegar na mesma corrente, com o timão apontado certeiramente pro rumo eleito em comum acordo por todas as partes de mim. São muitas mulheres berrando: siga em frente! E não sei quem fala mais alto.

Se é a menina moleca que adora dormir de pijama de flanela. Ou a garota irreverente que arrebanha risadas dos amigos. Pode ser que seja a mulher obstinada que vislumbra um caminho profissional. Ou até mesmo a moça frágil que às vezes fica calada e põe-se a chorar. Não estranharia se fosse a voluptuosa fêmea, que clama por uma paixão. Ou ainda a hedonista criança que não se cansa dos prazeres infinitos. Pode bem ser que o grito seja um eco da abafada voz da ingênua adolescente, que descobriu muitas coisas do mundo tardiamente. Ou seja apenas a reclamação aturdida do tão calado sussuro outrora esquecido. Podem ser pensamentos ultrapassados tentando ganhar o mundo. Pode ser um suspiro que virou soluço.

Mas não importa! Não importa quem fala mais alto. Existem milhares de mulheres dentro de uma só. E essas mulheres pedem passagem. Pedem espaço e marcham resolutas. "Siga em frente! Sempre em frente! "

Entendi que era hora de me livrar dos problemas e sonhar livremente. Olhar pra mim. Reconhecer-me em mim. Não negar nada daquilo que eu sou. Fitar o espelho. Vejo aonde está cada pinta, cada mancha, cada cicatriz. Mapeio-me por completo. Caminho por minha geografia. Subo os morros, caio nos buracos, pulo as depressões. Passeio pelo relevo que há em mim, que sou eu, que é meu corpo, minha alma. Aprendo a navegar por minhas costas, estas que mal enxergo. Viajo pela nuca e sinto que me pertence esse pedaço de mim pra que esqueço de olhar. Danço por entre as coxas, as pernas que me guiam. Dou um pulo dentro do meu umbigo e mergulho nas minhas entranhas, em tudo o que há de essencial em mim. Vou aprendendo o caminho da minha dor e do meu prazer. Preciso saber guiar-me por mim. Mapear o que há aqui, o que há em mim mesma que nem mesmo pra mim revelou existir.

Cuido desse oceano sem mar para deixar a água me lavar. O gosto do sal que me leve. O porto é uma conseqüência, viajar é ancorar.

Já disse que gosto de andar de pedalinho?

domingo, 25 de janeiro de 2009

Regra de três composta: eu, você, o outro.


Visão. Audição. Olfato. Tato. Paladar. 

São cinco os sentidos. São milhares as formas de perceber o mundo. As imagens, os sons, os cheiros, o toque, os gostos. Com essa combinação a partir de uma fórmula tão simples, podemos sentir o que paira ao nosso redor. Sentimos medo de escuro, frio na barriga, frio de rachar. Sentimos que vamos morrer de fome, morrer de sono, morrer de chorar. Sentimos muitas coisas. Sentimos muito.

As pessoas se aproximam de nós e sentimos vontade de dar um passo pra frente ou para trás. Às vezes sentimos vontade de correr pro abraço, às vezes vontade de correr em outra direção. Às vezes sentimos vontade de correr pro abraço e acabamos correndo em outra direção. É uma forma de economizar sentimentos como se fossem frutos de uma fonte esgotável.

Os sentimentos e as diferentes formas de sentir nunca se esgotam. Não foram feitos pra serem guardados. Não são e não devem ser seus. Sentimentos transformam-se, migram, mudam, ganham novos significados. Sentimentos específicos por pessoas específicas, podem até acabar, mas a capacidade em sentir será uma companheira constante em nossa caminhada pela vida. Pra quê economizar, então? Fale mais sobre o que sente. Demonstre mais o que sente. Experimente o sentir. Veja novos horizontes, escute novos sons, sinta novos aromas, toque de verdade, prove novos sabores.

Tudo o que nos rodeia são estímulos. A alguns destes estímulos, reagimos. A outros não. A capacidade em reagir nos é inerente. Trocar informações e estímulos com o meio e com as pessoas inseridas no meio é uma questão de opção e não exige grande habilidade. Utilizar nosso potencial sensorial, isso sim é uma grande habilidade e, como tal, não nasce com todos nem pra todos, mas está ao alcance dos que procuram. Sentir é saber sentir. É internalizar os estímulos e intencionar furacões internos ao simples soprar do vento.

No teatro da nossa existência, podemos escolher o papel principal de nossas vidas ou apenas uma ponta ali no canto, pra passar despercebido em nossos palcos pessoais, desprezando a importância de se entregar ao personagem por inteiro. Ser coadjuvantes de nosso próprio caminho significa ser um amontoado de cordas que trabalham para animar aquele ser que não consegue aquilo que há de mais elementar em si, simplesmente ser. Somos marionetes até que sintamos. 

Temos a nosso favor a beleza de soltar as cordas e atar os laços a cada sentimento que surge dentro de nós, a cada nova sensação que experimentamos, a cada olhar profundo que trocamos. Cada vez que nosso coração bate um pouco mais acelerado porque fomos fisgados por alguma sensação verdadeira, uma corda se solta e vai nos dando a condição de dançar conforme a nossa própria música e seguir com o nosso próprio passo.

O não sentir aprisiona-nos em nós mesmos e nos priva da chance de conhecer o bater de asas de uma borboleta dentro do (nosso) estômago. Negligenciar os estímulos que chegam até nós e duvidar do potencial de provocação das pequenas coisas a nos rodear mantém as cordas nos rumando e nos reduz a meros títeres. Mergulhar na vida e desfrutar do real viver a cada dia mantém acesa em nós a chama da auto-consciência, o fogo do momento presente, a força do amor-próprio.

Apaixonar-se pela sensação de viver apaixonadamente é nutrir a constante vontade de ser melhor no mundo e para o mundo. Significa alargar sorrisos e estreitar encontros. É trazer para perto de si gente que quer unir-se a nós numa profusão de elementos que passam a orbitar ao redor do todo como se fôssemos elos de uma mesma corrente. Porque não há intersecção maior do que a união profunda.

Sentir é viver. Sentir pouco? Sinto muito.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Das gavetas, nascem os ipês


Abrir gavetas é libertar a matéria estacionada de vidas que cabem em uma só. Significa dar ao pó a chance de sair ao invés de entrar. Abrir gavetas é a arte de saber aguardar quando a vida te oferece um trampolim para pular. Encher a mão de areia e sentir os grãos escorregarem. É assoprar o amendoim para todas as cascas voarem. 

Saber escolher, saber responder. Aprender a deixar pra trás. A despedir. A abraçar sem esperanças de reencontrar. É dizer adeus com o coração cheio de dor sem saber se há depois. Às vezes é melhor embarcar. Às vezes é melhor perder a hora. Às vezes é melhor ficar de longe e ver as partidas. Aprende-se muito quando faz sentido deixar ir. 

Aproximar-se de semelhantes. Somar idéias e ideais em prol de algo grande, que cresce junto. Dialogar em línguas que se entendem. Dizer meias-palavras e ganhar frases inteiras em troca. Unir o que se acredita com o que pode acontecer. Dizer não quando algo diz que é melhor assim, mas também saber dizer sim.

Um belo dia a gente sente que o mundo parou. Pararam os carros nas ruas. As pessoas pararam. Estão parados os olhares. Está tudo coberto por uma casca que inibe a livre expressão. Nesse momento, compreendemos que mexer os olhos faz os olhos do outro também mexerem. Se dançarmos, o outro dança. Se caminharmos, o outro caminha. E podemos dar o ritmo de nosso passo ao mundo. Ao nosso mundo.

Abrir gavetas muitas vezes abre portas. Traz pra vida a poesia em forma de mãos. Mãos que se atam num enredo em que faz todo sentido bater o carro porque a mente cansou de dirigir e foi ali admirar um ipê.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Despertar


De tanto tentar se encontrar, perdeu-se de si mesmo. Deixou a cargo de mãos que não as dele o controle de uma vida que já não mais lhe pertencia. O caminho já não era claro e o rumo a tomar, totalmente incerto. A mente absorta carregava-se de pensamentos e não mais enxergava luzes. Tudo escuro. A mão que não era dele tateava a cama procurando o que não conseguia achar. Acordou de uma realidade onírica em que nada se via além de neblina. Esfregou os olhos e caminhou trôpego até o espelho do banheiro. Na última vez que havia encarado a si mesmo ela não estava ali. A barba grande demonstrava o passar do tempo. O cheiro acre do ar denunciava a ausência de afeto. As janelas fechadas há dias ansiavam abrir-se à inundação do vento. A geladeira vazia, presenteava-lhe com uma garrafa de água pela metade.

Naquela hora, escolheu viver. Nem mais um suspiro.

Da barba não restou nem mais um fio. O ar exalava perfumes inspiradores. Brotavam, sobre a mesa, de dentro das garrafas, flores.

Do entorpecimento, restavam-lhe vazios. Não conseguia reconstruir o passado. Mas ocupou-se do presente esperando pelos louros do futuro.

Sentar de nada adiantava. Pôs-se de pé e mirou o horizonte. Os calos nos pés já não doíam mais. Caminhava rumo ao desconhecido sem medo de enfrentar o maior dos desafios. Corou ao ver pessoas a sorrir-lhe. Abriu o peito e marchou sem cessar. O vento no rosto alimentava seu íntimo amanhecer. Não sabia o que era dor. Não sabia o que era prazer. Mas sabia como poucos o que poucos sabem. Ele sabia querer.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Redação pro Vestibular


REDAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA
Redija uma dissertação, apresentando argumentos que se contraponham à seguinte concepção de tempo expressa pelo poeta clássico Ovídio: o tempo, esse devorador de coisas.

Na sala do colégio onde estudei há 10 anos a cabeça fervilhava. 30 questões de espanhol, 120 questões de humanas e 30 linhas depois...

"Ontem nós éramos o que tu és, amanhã será o que nós somos". A frase que habita o portal de um cemitério perdido no espaço físico é uma máxima sobre a inexorabilidade do agente temporal. Sim, o tempo passa. E, em sua rota de desvarios, deixa incólumes as marcas do progresso. O tempo não apaga os grandes feitos, os grandes ditos, os grandes amores, as grandes obras. É como a tempestade que alaga cidades, mas não varre a alma do lugar. O que é sólido fica.

Desde muito ontem, sabemos do legado que ficou daqueles que aqui estavam antes de nós. Os seres e as coisas que nos antecederam não o fizeram sem deixar rastros. E, numa intrincada colcha de retalhos, tecemos a história do mundo. À medida em que passam os anos, vão sendo tecidas novas peças, de modo a conceber um alento para a memória de cada época: uma fôrma para unir os mais diversos conjuntos de conquistas da sociedade e aquecer o patrimônio imaterial de toda gente. E residem nesse emaranhado de registros toda e qualquer memória daquilo que a humanidade - e por que não, a natureza? - construiu.

O que seria das cidades atuais se não houvesse começado entre os gregos e romanos o estudo da arte da construção e dos estilos arquitetônicos? E dos grandes artistas, sem o princípio da técnica, dos meios e da finalidade da expressão? E da consciência, sem os primórdios da Filosofia?

A sociedade atual colhe os frutos de uma plantação sem começo e cujo fim pouco importa. Importante é fazer parte do processo, colhendo o que já foi plantado sem nos esquecer de germinar novas sementes. Porque o tempo passa, mas a árvore e suas raízes ficam.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Para aqueles que procuram respostas em um blog


Oi! Você está procurando respostas em um blog? Neste blog especificamente, hum? São respostas de que tipo? Lamento informar, mas esta resposta está em falta. Aceita sugestões? Não, não trabalhamos com soluções, apenas sugestões. Resposta para os problemas também está em falta. Aceita uma sugestão? Ok, você não quer sugestões... Que tal levar então uma palavra? Ah, palavras podem ser de todo tipo, toda natureza. Tem palavras bonitas, feias, simples, complexas. Pra quê servem? Elas servem pra enfeitar a vida. Isto é, você escolhe o que fazer com elas. Normalmente, eu as uso pra enfeitar. Sim, você pode usar as palavras pra agredir. Mas leia a bula com cuidado: há contra-indicações neste caso. Bom, se você não quer levar uma palavra pronta, eu posso dar uma sugestão. Ah é, você não aceita sugestões. Posso, então, indicar? Hum, indicação você aceita. Eu indico a reciclagem. Não, não é pra você levar esta palavra. É pra você usar as letras que já tem em casa e criar a sua própria palavra. Pode ser muito mais divertido do que ter uma palavra pronta. E pra quê serve? Bom, você pode pedir pra alguém dar um significado. Se precisa ter um significado? Não é que precise, mas uma palavra sem significar deixa de dizer. Não, nem sempre tem que dizer. Se você permitisse ao menos uma sugestão... Posso dar então? Se você quer deixar de dizer, minha sugestão é o silêncio. Não sei se é a única forma. Sei que as palavras erradas nem sempre funcionam. Vai levar o silêncio então? Isso significa que aceitou minha sugestão. Uma sugestão e um silêncio. Faça bom proveito! Obrigada e volte sempre!


"Todas as palavras boas estão pálidas de exaustão. Flores, lua, olhos, lábios. Eu gostaria de escrever como se a literatura nunca tivesse existido. Eu não consigo; a ironia devora as palavras. É a maneira mais fácil de superar a dificuldade de se descrever as coisas".
Victor Shklovsky

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

I want to go back to Bahia


Estou com preguiça. Não aquela preguiça de uma rede e uma tarde a ver navios. É preguiça de encarar as coisas chatas, as pessoas chatas, a parte chata da vida. Estou com preguiça de deixar gente pelo caminho, de ser deixada pelo caminho e de sofrer por isso. Preguiça de acordar em dias sem cor, sem gosto bom. Estou com preguiça de falar e não ser entendida. Preguiça de ter idéias e não ter com quem dividi-las. Preguiça de abrir uma garrafa de vinho e ver uma taça vazia ao lado. Preguiça do vestibular: ter de decidir. Preguiça de encarar Brasília quando o que quero mesmo é minha rede na Bahia.

Regra de três simples: este está para esse, assim como esse está para aquele. E você, está pra onde?


Hoje eu acordei com vontade de fazer diferente. 

Parei de insultar os políticos. De agora em diante, vou prestar atenção em tudo o que faço de transgressor. Do troco que veio a mais e eu não devolvi até a mentira sobre a idade das crianças pra pagar menos (ainda as obriguei a confirmar a mentira. Que exemplo!). Antes de falar que os políticos roubam, vou me lembrar que eu compro CD's piratas e que eu falsificava minha identidade pra entrar nas boates antes dos 18.

Parei de citar as inúmeras catástofres conseqüentes do aquecimento global. De agora em diante, vou separar meu lixo, fazer uma composteira, comprar menos, dar prioridade a produtos orgânicos e embalagens bio-degradáveis. Nada de pegar sacola plástica no supermercado, nem comprar produtos que venham em bandeijas de isopor. Os passarinhos, fora da gaiola, por favor. E se você não gosta de animais domésticos, como eu, não crie um mal-criado deixando pro seu filho uma noção errada do que é amor à natureza.

Parei de falar da falta de qualidade do ensino público nas escolas do Brasil. De agora em diante, vou juntar um grupo de amigos e montar oficinas de apoio pedagógico e recreação para auxiliar o processo educativo das crianças com dificuldade ou defasagem nos estudos. Não dá pra suprir a carência de uma escola, mas dá pra trazer muito aprendizado pra dentro da vida de muitos deles. Nem sempre o que falta é o conteúdo massivo da escola. Muitas vezes falta colo, conversa e lazer. Tem horas que uma folha de papel e um lápis de colorir podem ser grandes amigos de quem não acha que brincar é coisa séria.

Parei de me envolver com as injustiças sociais a cada esquina. De agora em diante, vou olhar pelas pessoas mais necessitadas que estão ao meu redor. É uma forma de entender um pouco mais a realidade deles e poder fazer algo efetivo por alguém com dificuldades. Com os olhos voltados para fora da janela do carro, nem sempre percebo que as pessoas mais próximas podem precisar, e muito, de ajuda. Um gesto efetivo significa mais do que mil palavras.

Parei de rotular as pessoas por uma atitude ou comentário que me repugnou. De agora em diante, vou me esforçar pra ver o ser humano por trás daquilo que me incomoda. Quantas vezes somos vítimas de nossas próprias palavras e consideraríamos tremendamente injusto se nos transformassem no erro que cometemos? Existe gente além dos erros. Não estamos mais certos porque já superamos alguns medos, feridas ou preconceitos. E quem disse que a nossa intolerância tem mais mérito do que os pequenos deslizes alheios?

Parei de dizer que "O Brasil não vai pra frente". De agora em diante, vou me espelhar em iniciativas construtivas. Tem muita gente trabalhando por um mundo melhor, engajada em projetos sociais, ONGs, associações e muito mais. Antes de reclamar de um serviço ou de uma atitude e assumir que o país não funciona, vou procurar conhecer exemplos que deram certo. 

Parei de dizer que alguma coisa é importada, com a boca cheia de orgulho. De agora em diante, vou abraçar o que é nosso. Esses artigos vêm com uma enorme etiqueta que atesta a procedência estrangeira, como se qualquer coisa que vem de fora fosse melhor do que os legítimos MADE IN BRAZIL. Além disso, em sua maioria, essas mercadorias vêm de países pobres que não contam com leis trabalhistas e aproveitam-se da exploração de mão-de-obra barata. Um desrespeito àqueles que produzem e à qualidade do que é nosso.

Parei de reclamar da sujeira da rua enquanto eu não começar a catar cada papel que vejo jogado pelo chão. De agora em diante, é sacolinha de lixo no bolso, na bolsa, no carro e mãos à obra! Até eu assumir que os espaços que eu ocupo são, em alguma proporção, responsabilidade minha, prometo ficar de bico calado. Vale organizar mutirão, buzinar pro carro ao lado que jogou lixo na rua, ensinar as crianças a guardarem o papel de bala no bolso se não tiver lixeira. Vale qualquer atitude, só não vale ficar parado.

Parei de juntar roupa no armário. De agora em diante, tudo o que eu não "amo", vai ser de alguém que vai "amar". Porque é bom esse tal de desapego. Dá um alívio ver o guarda-roupa cheio de espaços e saber que pessoas estão dando utilidade a coisas que estavam estacionadas em nossas vidas. Dá uma levantada no astral, uma sacudida na poeira. O resultado final é a volta por cima.

Parei de fazer perguntas pras crianças sobre "namorados", azul e vermelho, bailarina e bombeiro. De agora em diante, vou apresentar a elas um mundo de sensações mais legítimas. Elas assistem jornal, cenas de seqüestro ao vivo, beijos calientes, crimes, além de serem estimuladas por um consumo ferrenho. Meu papel vai ser ensinar a montar quebra-cabeça, falar de fadas, princesas, dragões e mundos imaginários. Nada de antecipar a maturidade, ainda mais encaixando-as em estereótipos que possam vir a oprimí-las no futuro. Criança é criança. Não tem que achar que existe brincadeira de menino ou de menina, que existe cor de menino ou de menina. Elas têm que descobrir o mundo através da ingenuidade que nós perdemos com o passar do tempo.

Sei que não é fácil incorporar tantas resoluções. Tem coisas que eu já faço. Tem coisas que eu nunca fiz. Tem coisas que eu quero começar a fazer logo. Estou falando de mim e de você. Estou falando de agir sem pensar, de atitudes inconseqüentes, de vícios incorporados ao dia-a-dia. Falo de exemplos, de construção de caráter. Quero dizer que as coisas estão mais dentro do que fora. Que tal começar esta viagem interna? Dá pra repensar certos padrões, não dá? O mundo tá passando. O tempo não pára nem para dormirmos. Ou a gente pega carona nessa cauda de cometa, ou a vida passa por nós sem que tenhamos plantado uma árvore ou dado um abraço apertado em alguém. 

Você tem uma resolução pra hoje?

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Hoje é dia de ser brasileiro?


Ergam suas bandeiras, vistam seus uniformes. Vamos às ruas bradar em alto e bom tom: Brasil!

É Copa do Mundo! Momento em que todos se unem em prol de algo maior. É a força dos brasileiros tornando milhões de gritos em uníssono. É o individualismo sendo jogado pra escanteio e o coletivo entrando em campo. É o apogeu do sentimento de que todos juntos somos "um" maior e mais poderoso. É a glória de ser mais brasileiro por um mês a cada quatro anos. Ao fim dos jogos, depois de alguns dias, as bandeiras vão sendo timidamente recolhidas, as camisas verde-amarelas vão sendo guardadas no fim da pilha no guarda-roupa e não se fala mais nisso pelos próximos quatro anos. É a paixão pelo futebol travestida de nacionalismo invadindo as casas, devorando nossas horas, dominando a televisão.


De certa forma, o que tem acontecido em Santa Catarina reavivou o sentimento que aflora em nós, brasileiros, durante a Copa. Incrível a quantidade de ações comunitárias em prol do bem-estar daquelas pessoas que se viram desabrigadas após o pavor da chuva. Temos sim, que ajudar a cada um dos desabrigados lá do Sul. Temos que enviar roupas, comida, água! Temos que mobilizar o exército, os bombeiros, a sociedade civil. Temos que mostrar para nossos irmãos que eles têm o nosso apoio e que lamentamos muito tudo o que acontece por lá.

Realizo-me enquanto brasileira vendo partir de tantas pessoas, de tantos lugares essa corrente de auxílio. É bonito de ver essa vontade que brota em nós, que estamos do lado de cá, de ajudar aos que precisam, do lado de lá. Mas acho de extrema importância ressaltar a necessidade de uma tomada de consciência sobre a condição em que se encontra a maioria das pessoas de nosso país que vive diariamente o que Santa Catarina enfrenta há duas semanas.

Que não ergamos nossas bandeiras somente agora que a chuva caiu. Que possamos erguer bandeiras e vestir a camisa para ajudar as vítimas da falta de chuva no sertão nordestino, os povos ribeirinhos da Amazônia, as inúmeras famílias que vivem em favelas e nas ruas em condições sub-humanas. Que não deixemos de nos comover com as adversidades diárias, como as escolas sucateadas em que nossas crianças ficam sem merenda, as creches carentes de alimentos e recursos básicos, os hospitais sem leitos e sem médicos para atender nossos doentes, os centro de recuperação de dependentes químicos onde sequer há roupas para vestir os que procuram ajuda.

Que Santa Catarina sirva como ponto de partida para uma sociedade mais humanitária. Que não recolhamos nossas bandeiras. Que não nos esqueçamos dos laços verde-amarelos que nos unem a tantos outros necessitados. Que não falemos disso novamente apenas na próxima enchente. Sejamos mais brasileiros. Sejamos mais humanos. Olhemos para o próximo sob qualquer condição, debaixo d'água ou não. Que o nosso sentimento nacionalista não fique à mercê das marés que vêm e vão. Coloquemo-lo em terra firme, atuante sob qualquer adversidade, em qualquer estação.

Texto escrito em 04/12/08, no auge das enchentes, antes do blog existir.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Aproximação máxima de dois inteiros


Não entendia a insistência. Eu a vira há tantos anos. Era uma menina ainda. À época, sentia-me distante devido à diferença de idade, hoje não mais importa. Dizem dela palavras mil. Por vezes, chego a imaginar com quem se parece. Em outras tantas, sinto-me tão bobo que desfaço o pensamento em risos.

Ainda assim, insistiam. Nós havíamos de nos encontrar por insistência. De minha parte, apenas curiosidade e muito pouca, mesmo assim. Da parte dela, sabe-se lá. Quase forçado, aceitei então, o constrangedor episódio.

Descobri tarde demais que meu pouco caso era um privilégio. Depois de vê-la, impossível a indiferença. Fui devorado por seus encantos. Flagrava-me completamente absorto a reviver todas as suas nuances.

A cada encontro, uma vontade desmedida de que o instante virasse eternidade. A cada despedida, o enorme desejo de vê-la novamente. Nos dias sem ela, vivia os sonhos enfermos de uma mente febril.

Já não mais sentia paz. Transitava entre o êxtase em sua companhia e o torpor que sua ausência me causava. Minha vida resumia-se aos dias, felizes, em que podia fitá-la a poucos metros de distância. E aos dias, infelizes, em que tinha apenas sua lembrança a acompanhar-me.

Meu amor próprio transformara-se em amor por ela, ao ponto em que sentia-me incapaz de existir sozinho. Por vezes, via-me recriando a memória dos dias de felicidade. Em outras, criava todo um futuro em sua companhia em planos quase arquitetônicos.

Dei tanto de mim a este amor, que não me sobrou nada para ofertar-lhe. De tudo o que me tornei, restou-me apenas ser um pouco. E um dia ela se foi. Queria um ser completo e não, ser a parte que completa outrem. E eu entendi.

E busco em mim o que me falta para ser novamente.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

A incrível arte de ser criança


Brincavam tanto! Pique-pega, pique-esconde, pique-cola, pique-isso, pique-aquilo. Amarelinha, peão, pula-corda, patinete. Quebra-cabeça, caça-palavra, boca-de-forno, sai-da-toca. 

Brincavam tanto!

Um dia descobriram a massa de modelar. Brincavam tanto que se esqueciam da vida. Sujavam todo o chão, toda a casa, toda a roupa.

Ah, como brincavam!

Sujavam paredes, a mobília, o chão de cimento.

Mergulhavam de tal forma naquele mundo de cores, que nada escapava da implacável massinha: sujavam até o pensamento!

Não começou ontem. Começou muito antes de ontem. Começou lá no começo. E só vai acabar no fim.


Por que o assombro? Não, você não está diferente. Está com a mesma cara de ontem. Nem mais gorda, nem mais magra. Ainda de pijama. O cabelo despenteado. O mesmo cabelo, porém despenteado. Ainda está na pia a louça que usou no jantar. O copo d`água está pela metade em sua cabeceira. Nada mudou.

Entre o antes e o agora, passou apenas uma noite. Uma noite. O que pode mudar em uma noite? Olhe para você: o mesmo pijama! O pijama em que falta o botão da terceira casa, de baixo pra cima e deixa o seu umbigo à mostra. E que está com a manga esquerda descosturada. Não, você não está diferente.

Salvo o sol que chega e a lua que se vai, num giro de dor em que a Terra busca algo sem nunca encontrar, continua tudo igual. O orvalho sobre a folha verde da planta denuncia o escuro que passou para abrir-se em um largo sorriso iluminado. A luz abriga o conforto de se ver. O escuro abriga o tato, abriga o viver.

E o que faço eu com a noite que nada muda, quando eu acordo com tudo tão diferente que eu me calo, me mudo, me faço muda?

Eu sei que alguma coisa mudou. Uma criança nasceu e mudou a vida de uma mãe. O telefone tocou com a notícia de algum parente que faleceu e mudou uma família. Os pais esqueceram que era aniversário do filho e mudaram o sentido daquela data. Você perdeu o vôo e mudou a sua chance de sentar ao lado de uma pessoa sensacional. A chuva derrubou o muro da sua casa e mudou os planos para as férias. Uma pedra rolou e mudou o curso de um rio.

Você esqueceu-se de olhar pro lado e não viu o vizinho com quem brincava quando era criança. Decidiu ir para a esquerda e chegou atrasada. Fez uma piada boba e perdeu o amigo. Pegou um engarrafamento e não assistiu ao mais belo pôr-do-sol. Reparou quando aquela pessoa passava e não puxou conversa. Dormiu até mais tarde e perdeu o passeio com os amigos. Quando tomou coragem para despedir-se, ela já havia partido. Ficou confuso com o calendário e chegou pra um encontro histórico no dia seguinte. Envolveu-se com o filme e esqueceu o jantar no forno. Disse sim quando queria dizer não. Esperou o primeiro passo e tornou a espera mútua.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Minha Ode às Coisas Apressadas


Preciso contar
Preciso contar os minutos
Preciso contar as horas
Preciso contar

Preciso contar
Preciso contar os dias
Preciso contar as semanas
Preciso contar

Preciso contar
Preciso contar os meses
Preciso contar os anos
Preciso contar

Preciso contar
Contar o que falta (quanto tempo falta?)
O que me resta, senão a pressa
De ver o tempo passar?
Preciso contar

Sem contar o tempo
Que passei, sem contas
Do quanto precisava contar

Dei-me conta de que o tempo passou
O tempo passou
E eu ainda preciso contar

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

(EN)canto do pássaro


Um dia ouviu o canto do pássaro. Acordou-lhe o canto do pássaro. Faltava-lhe, agora, sono. Sobrava-lhe o cansaço. Tudo culpa do canto do pássaro. Segurou-se para não dar cabo do pobre animal.

Um dia ouviu o canto do pássaro. Acordou-lhe o canto do pássaro. Faltava-lhe, agora, cansaço. Sobrava-lhe um sorriso. Tudo culpa dos olhos fechados ao seu lado. Segurou-se para não cantar com o belo animal.

Um belo dia ouviu o encanto do pássaro. Acordou-lhe o encanto do pássaro. Faltavam-lhe, agora, sono e cansaço. Sobravam-lhe  sorrisos fartos. Tudo culpa dos olhos que se abriam e fechavam ao seu lado. Segurou-se para não voar. Era ele o pássaro.

sábado, 3 de janeiro de 2009

Momento Mafalda I


Às vezes eu sinto que
este planeta redondo
é a bola de futebol do universo

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Dona letra e suas duas bolinhas


Alguém pode avisar ao meu teclado que quando eu clico nas aspas e, em seguida, na letra U, eu estou apenas querendo colocá-la entre aspas? Apenas entre aspas!!! 

Ela não tem mais direito ao par de bolinhas sobre sua cabeça a lhe transformar a solidão em um trio harmonioso. As bolinhas foram recolhidas sumariamente para que nós, humanos falantes da língua portuguesa (mais de 200 milhões), possamos escrever igualzinho em qualquer canto do planeta.

Contem ao meu teclado que o trema foi abolido, ganhou carta de alforria e foi viver na Alemanha, aonde dão a ele seu verdadeiro valor.