segunda-feira, 13 de julho de 2009

A arte do encontro


A entrega de um ao outro, pode até ser apenas um fast food, um little delivery. Dizer que vou ali e volto já, pode até funcionar, mas depois acaba ficando alguma coisa pra digerir.

E esse processo começou há muito tempo. Começou com séculos de submissão e opressão. Mulheres que serviram (e ainda servem) foram subjugadas ao poderio masculino ao longo dos séculos. A História conta a vitória dos homens, os sucessos de uma sociedade patriarcal e suas imensas glórias. Eva carregou a culpa de ter oferecido a Adão o fruto proibido. Representa, até hoje, o pecado.

Nossas antecessoras começaram a construir o templo da libertação. Galgaram muitos passos da nossa caminhada. Empilharam inúmeros tijolos. Elas. Elas e o tempo. Uniram preces, mãos e esforços. Queimaram sutiãs, foram inquiridas e queimadas. Desabrocharam em belas flores, beberam do Flower Power. E, pouco a pouco, de geração em geração, foram iniciando o processo de nos despir de culpas, medos e inquietações. E nada do que foi ou será pode interferir no que o tempo construiu com tijolos de areia fina.

Em uma longa e delicada andança, conquistamos a licença poética de nos sentirmos livres dos pudores. É uma escada de muitos lutos que se partem degrau a degrau. É um caminho de muita abnegação. E é uma caminhada de mão-dupla em que um dá e o outro recebe na mais legítima troca. Ainda mais do que isso, é a vontade de viver a sintonia dos encontros e a beleza da sinceridade.

Pode ser que a areia fina ceda à pressão do tempo como uma ampulheta apressada, mas pode ser que nós coloquemos a dose certa de água para manter firme todo e qualquer sentimento de cuidado para com o outro. Porque dar-se ao outro é dar o que há de melhor em si. É receber aquilo que o outro lhe oferece de mais próprio. É a porta de entrada para a alma alheia que passeia entre dois corpos na hora da comunhão.

Encontrar alguém, presume presença, presume estar presente. É viver o momento com consciência de estar ali, de pertencer àquele lugar. É se apropriar dos cheiros, das cores, dos detalhes que compõem aquele instante. É entender o seu papel. É entender o papel do outro. É saber coordenar todas as existências envolvidas. É ser justo consigo e com o outro. Encontrar alguém é, antes de tudo, encontrar a si mesmo.

Ser homem. Ser mulher. Os papéis sociais definem muito mais do que a própria natureza reservou para a espécie humana. Não é uma questão de saber cozinhar ou de entender de carro. Passa antes por momentos de divisão, do estabelecimento de papéis naturais, em que cada um revela seus talentos para potencializar o que há de melhor na existência do outro.

Uma sociedade verdadeiramente justa se constrói com valores justos. Constrói-se com a justiça das palavras não ditas.

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