quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O futuro do pretérito


Consigo falar de mim. Consigo sim. Desde que joguei as palavras ao vento e coloquei este blog no ar, não fiz nada a não ser falar de mim. Quando escrevo sobre qualquer fantasia ou ficção, só consigo expressar coisas que estão guardadas aqui dentro. É o meu arquivo funcionando para adentrar em mundos novos ou nem tão novos assim. E tudo já é um pouco conhecido, já é meio meu, porque não há nada mais auto-biográfico do que um texto que expressa situações, sentimentos e percepções que, de alguma forma, fazem (ou fizeram) parte do meu arsenal de informação. A informação pode ser vivida ou estar vívida em minha mente vinda de qualquer outro canal, mas nunca é parte de algo absolutamente desconhecido.

Se escrevo sobre o fabuloso mundo dos polvos gigantes que soltam tinta cor-de-rosa, só o faço porque sei algo sobre os polvos (nem que eu tenha visto em alguma revistinha da minha infância), quero que eles sejam gigantes e acho que rosa vai combinar. Se descrevo a dor ou a alegria de um sentimento, é porque eu já o vivi. Se conto um conto, monto o cenário na minha tela imaginária com elementos que eu já vi, toquei, pisei, assisti em algum filme, li em algum livro. O que a imaginação me dá pra construir as minhas histórias e, por conseqüência, a minha história, é meu, é parte disso que sou. Se alguém me conta uma história linda ou diz uma frase genial, ganho um presente pro meu baú de palavras. Peço autorização se for usar em fronteiras além de mim. Se ganhar um sim, divido por aí a graça disso. Se ganhar um não guardo aqui mais uma portinha por onde entrar e imaginar.

O meu mundo é a soma de tudo o que eu fiz, faço, fui e sou. Complementado pelas pessoas que conheci e conheço. Adicionam-se coisas que perdi e encontrei pelo caminho, fatos e acontecimentos previstos e imprevistos, além de lugares por que viajei. Engrossam esse angu as histórias que ouvi, as comidas que comi e a quantidade de frutas e cores que conheço. Tem também as coisas de que gosto e de que não gosto. E as diferentes paisagens que contemplei, os filmes que me encantaram e os livros que me devoraram. Muito importante lembrar do número de passos que já contei e a mão que uso pra escrever (sou canhota no manejo do lápis e destra pro resto das coisas). Computo ainda, na matemática do meu ser, os arranhões, as picadas de inseto, os ossos que não quebrei, o aparelho fixo que usei, os dois pontos que levei e os óculos que, enfim, conquistei. São parte disso, ainda, os brinquedos feitos a partir de sucata, com destaque para o telefone de lata. E os meus talentos naturais (aquilo que é mais próprio de mim e por que eu nunca recebi um diploma)? 

Ah, tem também o nome! Um capítulo a parte na vida de qualquer pessoa. Meu pai é goiano e fala o "R" puxado. Minha mãe é alagoana e fala o "T" e o "D" com a língua tocando os dentes, com um sotaque bem nordestino. Na hora de escolher meu nome, tinha que ser um que os dois falassem igual. MaRcela, não podia. Nem TaTiana. Fiquei Thaís. Primeiro, sem "H". Meu pai achou com cara de "Tais" (tais artigos, tais coisas, tais despesas) e pediu pra colocarem uma letra extra no meio do "T" e do "A". O nome é coisa séria! Desde que nascemos somos destinados a carregar ele com a gente. Amado ou odiado, fruto de uma boa escolha ou um capricho dos pais, pode ser motivo de rimas belas, infantis ou até mesmo tristes. É a nossa identidade nua e crua: não tem como esconder, uma hora a professora vai e faz a chamada. Está lá a prova cabal que vai abafar o amado apelido ou entregar um sobrenome estranho. O nome é muito a gente. Determina uma parte da nossa personalidade desde que começamos a nos relacionar com o mundo e sermos chamados pelas pessoas que nos cercam.

E agora eu estou aqui, chamando a mim mesma. Escrevo um texto para que eu leia em voz alta e ouça um pouco das coisas que às vezes eu esqueço de conversar comigo mesma. Essa é a pauta de uma reunião interna, minha, com meu "eu". E, certamente, não foi a primeira e, muito menos, será a última. Eu sequer pretendo deixar de encontrar comigo mesma algum dia. Peço a você que registre os pontos mais relevantes e as questões omitidas para serem discutidos na próxima reunião. Por hoje é só. Todos estamos dispensados.

2 comentários:

Lidia Barreiros disse...

:)

Anônimo disse...

engraçado que seu pai se esforçou tanto pra colocar o "h", pra depois vir uma amiga llllouca na infância e acentuar o "a" ao invés do "i", jogando todo o trabalho do seu pai por água abaixo. Né, Tháis?