domingo, 7 de junho de 2009

Nunca ganhei um beijo


Preciso fazer uma confissão: eu nunca ganhei um beijo. Pasme! Mas ao contrário do que dizem muitas mulheres, nunca fui beijada.

Eu nunca achei que fosse possível ser beijada. Ser beijada presume um ato praticado por apenas um dos lados. E um beijo não se faz com um, mas com dois lábios aplicados na arte do encontro.

Todas as vezes em que foi oferecido a mim, o beijo ganhou tanto de mim quanto do outro.

É a mesma lógica do abraço. Ninguém ganha um abraço. Abraços são trocados. Numa sincronicidade não ensaiada, os braços de um envolvem o outro a tal ponto em que não se distingue quem começou e quem terminou aquele gesto.

Mesmo quando se pede um beijo, ou um abraço, não é algo que apenas se ganha. O pedido é apenas o despertar de uma ação que começa com duas (ou mais) pessoas e acaba com duas (ou mais) pessoas. O beijo só é beijo quando é praticado pelo todo. Assim como o abraço não é abraço sem o braço que envolve reciprocamente.

Quando damos um abraço e o outro não responde, fica aquela sensação de que há alguma coisa errada. Ou a pessoa é tímida, ou está chateada, ou, simplesmente, não sabe abraçar. Um abraço sem todos os braços, fica meio frio, meio vazio.

Um beijo sem duas bocas, um beijo de um lado só é beijo forçado, beijo recusado, beijo amedrontado, ou beijo que não quer acontecer. Um beijo de verdade é beijo em harmonia, como a forte sintonia entre o despertar do sol e o dormir da lua.

Beijar e abraçar são verbos reflexivos. As pessoas beijam-se e abraçam-se. E se não tiver o "se" fica uma coisa assim, meio sem ter pra quê.

O encontro é uma troca. Não tem dar, nem receber. Existe apenas uma escolha, a escolha do mútuo olhar, dos mútuos carinhos e do mútuo querer.

Receber beijos nos coloca na condição de espectador de algo que poderia ser vivido intensamente. Mesmo os beijos estalados, dados na bochecha ou na nuca, conversam com a pele e sentem os pêlos eriçados tocarem os lábios em resposta.

Dar um beijo, roubar um beijo só vale quando o outro colabora. Beijo forçado não é beijo, é lábio que aterrissa numa parede inerte que não escolhe aquilo que a toca. É como o mosquito que pousa em nossos tetos para perturbar o nosso sono. Ele não foi escolhido, ele só está ali.

No meu mundo, os abraços são cada vez mais verdadeiros e os beijos cada vez mais calorosos. Porque uma vida de beijos ganhos é uma vida sem trocar. E no espetáculo do amor (de todo tipo), mais vale ser ator principal do que platéia apática, que gasta aplausos a cada quadro a que assiste, como se não tivesse em si a capacidade de retribuir.

Um comentário:

Jéssica disse...

"Beijar e abraçar são verbos reflexivos."

E mais vale a idéia de um beijo a dois curto, do que um longo beijo recebido e solitário. Quero eu pensar que nunca fui beijada tambem.
:)